Panóptico

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

XAMÃ-CABÔCO (Poema-tributo a Chico Science, sempre presente na quântica dos sons)


Era noite no mangue da periferia,

a miasma da mesmice massificada

fodia as entranhas

                  dos homens caranguejos,

o tédio massageava a alienação

numa espiral mercadológica de sons.


Da lama ao caos, os recifes da vida

cortavam os ânimos e os nervos;

Mas, de repente, o surto criativo rebentou

nos cérebros antenados dos mangueboys

marcados de idéias, signos e sotaques.

Fez-se ouvir então nos becos lamacentos

o rock and roll híbrido inusitado

de batidas e batuques tribais.


Em meio a esse lusco-fusco neo-regional,

regado a cachaça e a maracatu,

surgiu o xãma-cabôco

 reciferando um otimismo beat,

que arrombou as barreiras da mente,

numa performance afrociberdélica

              com toda a Nação Zumbi.


sábado, 29 de janeiro de 2022

ERA UM SÁBADO À NOITE (Por Pirro)

Noite estrelada, de Van Gogh (1889)
                    "Noite estrelada", de Van Gogh (1889)

           Logo que entrei, um sujeito de gravata amarela, terno verde e calça azul, cresceu o olho para a estampa da minha camisa. Ele parecia a ordem e o progresso em pessoa. Não usava máscara.

            “Você gosta dos Beatles!”

            “Ouço algumas coisas deles”.

            “Sou fanzaço dos Beatles”

            “Massa”.

            “Você foi ao show de Paul McCartney”.

            “Fui, não. Assisti pela tv”.

            “Fui para dois shows dele. Em Buenos Aires e em Londres”.

            “Massa”.

            “Fiz inveja a você agora, não foi?!”, perguntou com um ar de riso.

            “Fez não... rsrsrsr”. Meu riso era o de quem não esperava que a noite fizesse surgir uma estrela, ali em minha frente.

            Ele chamou uma mulher de vestido vermelho e salto alto, que parecia ser sua esposa.

            “Moema, vem cá. Fiz inveja pra ele agora. Disse-lhe que fui em dois shows do Paul McCartney, e ele nunca foi”. O cara abriu um sorriso do tamanho da praia dos Náufragos.

            “Tá vendo! Ele está podendo, viu. Fez inveja para você” disse a mulher.

            “Porra nenhuma. Minha banda preferida é The Doors”, respondi para ela.

            Ele se aproximou.

            “The Dɔɔɔɔrs!”, exclamou esticando o som da vogal para inglês ver. “The Dɔɔɔɔrs... só gosto de Light my fire. Jim Morrison era apenas bonito”.

        “Morrison era um grande poeta e sua voz tinha uma pegada visceral, dionisíaca, lisérgica”. falei encarrilhando os adjetivos.

           “Jim Morrison era infantil”, disse ele. A dama de vermelho riu e puxou-o pelo braço:         “Vamos tirar selfies para os stories em frente àquelas flores”. A meio caminho, ele voltou-se para trás e acrescentou:

            “Gosto de Paul MacCartney. Ele é mais músico. Morrison é um drogado”.

         Não disse nada. Fiquei parado ali, com um riso plantado no rosto, olhando em silêncio aquele personagem interessante. Sabe, minha esposa teve que me arrastar de casa. Eu não queria sair, planejava assistir um bom filme no sábado à noite, ficar longe de aglomeração, evitar o vírus. Solange insistiu igual água em pedra dura. Ela disse que eu usaria máscara, levaria álcool 70 para as mãos, e álcool bem gelado para passar na garganta. Eu tinha que ir com ela para a colação de grau de Mirenna. “Você vai dirigindo”, falei. Ela concordou com ressalvas: “Tudo bem, mas vou no meu ritmo”. “Ok, vá no seu ritmo”. Esperava uma noite chata me aguardando. Eis que, de repente, surge o personagem. Agradeci à Solange por ter me tirado de casa.

       A Mansion estava enchendo de gente. O salão lotado seria celebração para o coronavírus. Saí do salão. Me dirigi ao local onde estava estacionado o carro, a três quarteirões do evento. Ao me aproximar, ouvi a voz do flanelinha ralhando com alguém:

            "Oião, miseráve, uzurento”, repetia sem parar.

          Abri a porta do carro e acendi a luz interna. Peguei o gelo e as cervejas que havia comprado em um depósito de bebidas no Orlando Dantas. Abri a mala, pus o gelo e as cervejas num saco plástico e deixei nela. O vento do Atlântico trazia e levava o bater das ondas, o barulho dos carros e a voz do flanelinha.

            "Oião, Miseravi, uzurento. Não deixa um carro pra eu, nada...".

          Fechei a mala. Peguei uma cerveja do isopor no piso do carro. Sentei no banco do motorista. Abri a latinha de heinenken. Acendi um cigarro chesterfield. Liguei o som. Ouro de tolo começou a fluir como as ondas da Praia dos Náufragos.


Eu devia estar contente

Porque eu tenho um emprego

Sou o dito cidadão respeitável

E ganho quatro mil cruzeiros por mês...

          Passei alguns minutos sentado, atento à poesia de Raul. Fiquei de pé, encostado na porta, fumando meu chesterfield e olhando para dentro do Mar Atlântico. Além dos confins da praia, via-se as plataformas de petróleo. Lá em cima, a lua cheia por trás de algumas nuvens, e dava para ver algumas estrelas, talvez fosse Saturno, Vênus ou Júpiter. Aqui embaixo, era o vírus, a colação de grau, as alegrias dos formandos e a voz do flanelinha:

            "Oião, miseravi, infiliz. Da próxima vez, chego cedo, aí quero ver qual moleque vai tirar de doido”, dizia a voz do outro lado da praia. "Oião, Miseravi, ingrato...".

            O flanelinha, para quem paguei 10 reais, passava em frente. Olhou para mim.

            “E aí, brother, beleza?”. Ele se aproximou.

            “Beleza”.

            “Qual o seu nome?”

            “Bio”.

            “Com quem ele está irado?” perguntei.

            “Comigo, patrão. É meu irmão mais novo”.

            “Parece que ele quer briga”, falei para Bio, já parado ao meu lado.

            “Que nada, patrão. Ele é inxamista. Tá cum ciúme”.

            “Ah!”.

            “Meus amigos vêm tirar uma grana aqui. Aí ele fica impricando, me xingando”.

           “Oião, Miseravi, uzurento. Da próxima, o melhor local será o meu.  Vou chegar cedo. quero ver quem vai me tirar. Quero ver!”. Levantei a vista. O irmão de Bio estava com o touro no calor do corpo. Andava de um lado a outro num trecho da rodovia, onde demarcou como seu estacionamento particular. Pelo visto, era o trecho menos privilegiado, pois os motoristas preferiam as vagas mais próximas do evento. Enquanto ele falava, agitava a flanelinha com uma mão e indicava as vagas para os carros que passavam.

            “Oião, Miseravi, uzurento...".  Seu refrão se chocava com o vento, enquanto o mar Atlântico rugia à nossa frente. Bio saiu correndo para atender um motorista, que procurava uma vaga em frente ao Hotel Tropical. Ainda chegava mais gente para o evento. Mulheres e homens, jovens e crianças, em roupas devidamente escolhidas para a ocasião.

            Sequei a latinha de cerveja. Peguei outra, desliguei o som, fechei e travei as portas do carro, bebi mais um gole de cerveja e saí andando. Parei na entrada da Mansion Eventos. Bebi outro gole de cerveja. Já não ouvia mais o bater das ondas na praia dos Náufragos. Já não ouvia a voz agitada do irmão de Bio. Entrei para o pátio lotado de veículos. Fiquei a 15 metros do portão principal. Me encostei no fundo de um carro. Ao lado, alguns homens e algumas mulheres conversavam. A certa distância, três deles de meia idade fumavam cigarro em silêncio. Suas máscaras estavam arriadas debaixo do queixo.

            “É bonito de se ver. É uma alegria só”, disse uma mulher já idosa.

            “Bonito é, mas não vejo futuro”, disse um jovem de trinta e poucos anos, metido num terno bem justo.

            “Também não”, concordou outro.

            “Pra mim, medicina e direito ainda são os cursos”. Disse uma jovem elegantemente vestida.

            “É verdade”.

          “Agradeço a Deus de ter feito direito”, disse ela. Enquanto falava, viajava pelas bolhas sociais num celular de última geração.

            Solange apareceu no hall de entrada. Ao me ver, se aproximou.

            “Dario quer uns goles de Pitú. Você trouxe?”

            “Não”.

            “Ele disse que só sobe no palco pra comemorar com Mirenna, se beber três doses de uma vez”.

            “Aí, fudeus!”

       “Parece doença, né. Se encher de cachaça, pra se se soltar. Vou dizer, viu”, disse Solange.

            “Se eu soubesse, teria colocado numa garrafinha de água mineral”.

            “Mas eu falei, você que esqueceu... Mas, tá bom. Ele vai ter que se virar nos trinta”.

            “Oh!”.

         Acendi outro cigarro. Solange olhou o celular. Viu algumas mensagens e fotos do evento no whatsap.

            “Já são 9:40. Dario e Cris vão subir no palco. Você vai ficar aqui fora?”.

            “Vou”.

            “Ok, vou entrar”.

            “Viu”.

            Solange recolocou a máscara e saiu no ritmo de mulher do sertão.

          Bebi mais um gole de cerveja, dei o último trago no chesterfield. Lá dentro, o pagode, o funk desfunkeado, o sertanejo urbano, o forró eletrônico, o arrocha. Eu senti o poder que aqueles sons tinham sobre mim. A vontade era de me mandar dali, de ir embora para casa. Como eu estava no ritmo de Solange, tive de resistir. Recoloquei a máscara e entrei no salão. Toda essa diluição de sons ditava a trilha sonora que se misturava com palmas, gritaria e apitos ensurdecedores.

         No exato momento que entrei, os pais da Mirenna subiram no palco. Foi a vez da Dario e Cris, foi a vez da família fazer barulho. O Coordenador de Nutrição felicitou os pais e agradeceu em nome da Tiradentes. Depois, entregou o canudo para Dario e Cris. Cris pegou o canudo e deu para a filha. Começaram a dançar com alegria e abraços. Dario parecia o homem de lata. Não dançava. De corpo duro, só dobrava os joelhos e vibrava as mãos lá no alto. Uma dose de cachaça faria dele o melhor malabarista e o melhor palhaço do Circo Maximus. A mãe da formanda dançava com desenvoltura ao lado do homem de lata, mas sem ousar demais. Mirenna estava bem alegre, ao lado deles, com o canudo na mão. Rindo de Dario, me dirigi ao mictório. Estava aperreado, a bexiga pedindo para ser esvaziada.

            A meio caminho, lá estava ele saindo do mictório, o personagem ajeitando a gravata, passando a mão no cabelo, sem máscara. Quando deu por mim, abriu o sorriso e limpou o nariz com os dedos.

            “Diga, black man”.

         “Diga”. Ele riu, limpou o nariz e ficou sério. Me observou, mas sem aquele brilho quando estava com a dama de vermelho.

            “Você de preto assim parece um anticristo”.

            “Sou o próprio anticristo”, falei com a bexiga já implorando.

            “E, pelo jeito, você é de esquerda. Acertei?”

            “Na mosca”, disse eu.

        “Não falei”, limpou o nariz, soltou a gaitada dos homens seguros no que falam e arrematou: “a esquerda tem que desaparecer”.

            Bati palmas para o personagem. Ele riu, limpou o nariz e ficou sério.

            “Black man, você já foi na Inglaterra, nos Estados Unidos, hein Blæeek man?”

            “Nunca”.

            “Só quero dizer, black man, que são uma maravilha, o cidadão é livre, é empreendedor de seu próprio caminho, sem a chatice do Estado na sua cola”.

       “Cada um por si. O resto que se foda. Né isso!”. A minha bexiga estava quase explodindo.

            “Exatamente”. Riu de novo, limpou o nariz e ficou sério.

        “Você me lembra o bicho-do-cesto. Só que a cor do seu casulo é verde, azul e amarelo”.

            “Como?!” fez ele, depois abriu a cancela: “kkkkkkkkkkkkk...”. Apontou o indicador para mim: “Blæek man, Jim Morrison só tinha beleza”. Me observou de esguelha, limpou o nariz e se afastou. Virei as costas, entrei correndo no mictório masculino.

            Lá pelas 22:20, a cerimônia acabou. Eu e Solange seguimos para o carro. O irmão de Bio agora falava algumas palavras em voz baixa. Parecia mais tranquilo. Solange assumiu o volante. Bio correu para orientá-la. Pedi a Bio para se aproximar.

            “Tome conta de seu irmão, cara. Mande ele esfriar a cabeça”.

            “Já dei a ideia, patrão! Ele não me ouve, patrão”.

            “Bio, olhe pra mim. Eu tenho cara de patrão?”.

            Ele riu, sacudindo a flanelinha vermelha de um lado para outro.

            “Tem não”.

            “Pois é”.

        “Foi mal, meu bródi. Valeu aí”, disse, mostrando o polegar apontado para o céu. Retribuí com o mesmo gesto. Bio parou o trânsito da via, com a flanelinha vermelha estendida acima da cabeça. Saímos do estacionamento. Falei para Solange seguir em frente e pegar um atalho para entrar na Rodovia dos Náufragos. Ela acelerou no ritmo dela e coloquei “The End” no toca-cd.

          Da rodovia dos Náufragos, seguimos para a Zona Norte. Chegamos ao Bugio às 11:00. A varanda da casa de Dario estava pronta para receber os convidados. Apenas parentes do círculo familiar. Peguei as cervejas e o gelo, coloquei no isopor térmico de Dario, que estava num canto da parede. Cadeiras e mesas foram ocupadas. Uns começaram a beber cervejas, outros a comerem doces e salgadinhos com refrigerante. Dario foi o primeiro a meter duas doses seguidas de Pitú garganta abaixo. Não fez careta nem pigarreou.

            “Dario, o que aconteceu lá no palco?” Ele riu.

            “Fiquei acanhado, ói. Nunca tinha ido num negócio desse, ói...”.

            “Acontece”.

            “Solange não levou o meu Pitú. Me lasquei”.

            “Acontece”.

            Abri minha cerveja, e me sentei a uma mesa onde estava Solange, minha sogra e Maria. “Cara, nutricionista gorda não cai bem”. Solange disse.

            “Por que?”, perguntou a irmã de Solange.

            “Vi uma lá. Maria, ela precisa se cuidar. Ninguém vai procurar nutricionista que não se cuida”.

            “Ah, entendi”, expressou a irmã de Solange.

            “Ouço as conversas na equipe dos Runners team. Todo mundo fala, Maria”.

            “Realmente. Não cola, não”, disse a irmã.

        O pai do namorado de Mirenna ligou uma caixa de som, acionou o karaokê do Youtube. Começou a cantar “Sábado”, de José Augusto. Cantava de cabeça meio baixa, acompanhando a letra pelo celular. Ele parecia um artista instrospectivo cantando apenas para si. Solange arrastou Dona Guida para dançar. Quando chegou no refrão de “Sábado”, o coro das mulheres acompanhou o simpático artista.


Eu já tentei

Fiz de tudo pra te esquecer

Eu até encontrei prazer

Mas ninguém faz como você

Quanta ilusão

Ir pra cama sem emoção...

            O cantor instropecto emendou “Em plena lua de mel”, de Reginaldo Rossi.


Toda vez que o seu namorado sai,

Você vai ver outro rapaz.

Olha todo mundo está comentando:

Seu cartaz tá aumentando...


            Maria lembrou logo do casamento de seu primo, no Povoado Várzea Nova.

       “Nunca me esqueço. Escolheram justamente essa música. Zé gostava muito dessa música”.

        “Como é que bota uma música dessa em pleno casamento! Quem já se viu!”, disse minha sogra.

          “Ele mesmo colocou. Ele gostava muito. Na casa dele, era a que mais se ouvia”.

         “Eu lembro. Mataram um porco, muita bebida quente, cerveja... fizeram a maior festa”.

            “Falaram que ele tinha enchido o cu de cachaça no dia”.

            “O povo diz que ela voou de moto até Glória, e traiu ele em plena lua de mel”, disse Maria.

            “E, realmente, o casamento não deu certo”, arrematou Solange.

            Mirenna chegou até a mesa onde estávamos:

            “Acabaram de matar um flanelinha lá na praia, perto da Mansion Eventos”.

            “Você viu onde?” perguntou Maria.

        “No Insta do Gordinho do Povo. Parece que um irmão matou o outro. Foi o que disseram nos comentários”, acrescentou Mirenna para os que estavam sentados à mesa.

            “Viixe. Não suporto esse Gordinho”, disse Solange.

            “Também não. Ele é um abutre, um Dantena, um Bareta das redes sociais”, falei.

            O cantor pegou o microfone de volta, e ele me surpreendeu pela escolha. Ao som de “Ouro de tolo”, me levantei da cadeira, peguei uma heineken e saí para a rua. Fiquei na calçada, acendi um cigarro, traguei e soltei a fumaça, que desapareceu para além dos postes de luz e telhados de concreto.


segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

A SIERGUÉI IESSIÊNIN (por Vladímir Maiakóvski)

Você partiu,

                 como se diz,
                                    para o outro mundo.
Vácuo. . .
             Você sobe,
                             entremeado às estrelas.
Nem álcool,
                 nem moedas.
Sóbrio.
           Vôo sem fundo.
Não, lessiênin,
                      não posso
                                     fazer troça, -
Na boca
             uma lasca amarga
                                        não a mofa.
Olho -
          sangue nas mãos frouxas,
você sacode
                  o invólucro
                                 dos ossos.
Sim,
       se você tivesse
                             um patrono no "Posto"(1) -

ganharia
            um conteúdo
                               bem diverso:
todo dia
            uma quota
                           de cem versos,
longos
          e lerdos,
                       como Dorônin(2).
Remédio?
               Para mim,
                               despautério:
mais cedo ainda
                        você estaria nessa corda.
Melhor
           morrer de vodca
que de tédio !
Não revelam
                   as razões
                                 desse impulso
nem o nó,
               nem a navalha aberta.
Pare,
        basta !
                   Você perdeu o senso? -
Deixar
          que a cal
                        mortal
                                  Ihe cubra o rosto?
Você,
         com todo esse talento
para o impossível;
                          hábil
                                  como poucos.
Por quê?
             Para quê?
                            Perplexidade.
- É o vinho!
                 - a crítica esbraveja.
Tese:
         refratário à sociedade.
Corolário: 
                muito vinho e cerveja.

Sim,
       se você trocasse
                                a boêmia
                                             pela classe;
A classe agiria em você,
                                    e Ihe daria um norte.
E a classe
                por acaso
                               mata a sede com xarope?
Ela sabe beber -
                        nada tem de abstêmia.
Talvez,
          se houvesse tinta
                                    no "Inglaterra"(3);
você
        não cortaria
                          os pulsos.
Os plagiários felizes
                              pedem: bis!
Já todo
           um pelotão
                           em auto-execução.
Para que
              aumentar
                            o rol de suicidas?
Antes
         aumentar
                       a produção de tinta!
Agora
         para sempre
                           tua boca
                                        está cerrada.
Difícil
        e inútil
                  excogitar enigmas.
O povo,
            o inventa-línguas,
perdeu
          o canoro
                       contramestre de noitadas.

E levam
             versos velhos
                                 ao velório,
sucata
          de extintas exéquias.
Rimas gastas
                    empalam
                                  os despojos, -
é assim
            que se honra
                                um poeta?
-Não
        te ergueram ainda um monumento -
onde
        o som do bronze
                                 ou o grave granito? -
E já vão
            empilhando
                             no jazigo
dedicatórias e ex-votos:
                                   excremento.
Teu nome
               escorrido no muco,
teus versos,
                  Sóbinov(4) os babuja,
voz quérula
                 sob bétulas murchas -
"Nem palavra, amigo,
                               nem so-o-luço".
Ah,
      que eu saberia dar um fim
a esse
          Leonid Loengrim!(5)
Saltaria
            - escândalo estridente:
- Chega
            de tremores de voz!
Assobios
             nos ouvidos
                              dessa gente,
ao diabo
             com suas mães e avós! 
Para que toda
                    essa corja explodisse
inflando
            os escuros
                            redingotes,
e Kógan(6)
               atropelado
                               fugisse,
espetando
                os transeuntes
                                      nos bigodes.
Por enquanto
                    há escória
                                    de sobra.
0 tempo é escasso -
                              mãos à obra.
Primeiro
             é preciso
                           transformar a vida,
para cantá-la -
                      em seguida.
Os tempos estão duros
                                   para o artista:
Mas,
        dizei-me,
                     anêmicos e anões,
os grandes,
                 onde,
                          em que ocasião,
escolheram
                  uma estrada
                                     batida?
General
            da força humana
                                     - Verbo -
marche!
            Que o tempo
                               cuspa balas
                                                 para trás,
e o vento
             no passado
                              só desfaça
um maço de cabelos.
Para o júbilo
                   o planeta
                                 está imaturo.
É preciso
              arrancar alegria
                                     ao futuro.
Nesta vida
                morrer não é difícil.
O difícil
           é a vida e seu ofício.

(Tradução de Haroldo de Campos)

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1. Alusão à revista Na Postu (De Sentinela), órgão da RAPP (Associação Russa dos Escritores Proletários), cujos colaboradores se mostravam muito zelosos em atacar os escritores que lhes pareciam transgredir a moral proletária.

2. Referências ao poeta soviético I.I. Dorônin (n. em 1900).

3. Hotel em que Iessiênin se suicidou.

4. O famoso cantor L.V. Sóbinov (1872-1934) foi um dos participantes
da homenagem à memória de Iessiênin, que teve lugar no Teatro de Arte de Moscou, em 18 de janeiro de 1926, quando interpretou uma canção de Tchaikóvski.

5. O papel de Loengrim, da ópera deste nome, de Wagner, constituiu um dos grandes êxitos da carreira artística de Leonid Sóbinov.

6. O crítico P.S. Kógan (1872-1932), representante da crítica mais dogmática, com quem Maiakóvski manteve freqüentes polêmicas.

 

CAMPOS, Augusto de, et al. Vladímir Maiakóvski. IN: Poesia russa moderna. Traduções de Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman. São Paulo: Perspectiva, 2001.

OS USURPADORES RELIGIOSOS

Pablo Picasso









             


          Todo pastor e todo padre se apossam da psiquê do humano e o fragiliza para poder domesticá-lo como cordeiro e dominá-lo completamente. A neurose religiosa é o resultado de tais práticas por parte dos sacerdotes.

          Essa dominação simbólica e sutil acontece por meio de ferramentas psicológicas para causar o medo. O diabo é a ferramenta mais eficiente nesse sentido do que deus; este também sempre foi e é evocado para causar medo, por meio de castigos e penitências. Pecado, remissão, perdão, redenção e salvação são valores cristãos utilizados para a possessão do espírito do fiel a partir do uso do instrumento diabólico-divino pelos sacerdotes.

         Enfim, todo sacerdote é um usurpador psicoteológico, é um tirano que rouba e se apossa das almas e as fragiliza para tê-las em suas mãos mentirosas e falso-moralistas.


terça-feira, 24 de novembro de 2020

PASSAGENS (CONTO)

  Por Pirro


                 Eu ouço a chuva bater lá fora. São seis em ponto da manhã. Permaneço deitado por alguns minutos. Fui dormir incomodado com o conto de James Joyce. E amanheço com os “mortos” ao meu redor. Levanto da cama e me espreguiço. Escovo os dentes, lavo meu rosto. Saio para a sala, esticando os braços para cima. Abro a porta da frente. Me encosto na coluna do alpendre. Olho para o céu nublado, está com cara de chuva; e o vírus, mais antigo do que a memória, continua nas trincheiras desta manhã. Os Mortos de Joyce não saem da minha cabeça. Cada expressão, cada palavra, cada lágrima de Gretta me tocam. Olho as horas no celular. Deixo o alpendre e entro.

           Faço café rapidamente. Como cuscuz com frango e pimenta. O sol lá fora desaparece. A chuva cai como uma amante afetuosa sobre a manhã. Sento no sofá da sala-de-estar. Um vento meio frio entra de porta adentro, afaga meus braços e meus cabelos. Pego Joyce na estante, releio alguns trechos do conto. Uma história simples, nada parece acontecer de extraordinário. Na verdade, revela a matéria finita da existência e o fluxo do tempo. As recordações dos personagens irrompem e nos levam em suas águas correntes. Fecho o livro e vejo Gretta Conroy parada no meio da escada, escutando The Lass of Aughrim por uma voz plangente que vêm do andar de cima. Algo acontece nela ao ouvir aquela “música distante”. Vejo ela calada e alheia às conversas, com uma expressão melancólica no rosto, enquanto Gabriel a observa quieto no pé da escada. Conecto ao Youtube, assisto à mesma cena, perfeitamente reconstituída pelas mãos de John Huston. Talvez uma das melhores cenas que já vi no cinema. A expressão pujante do rosto de Angélica Houston, no papel de Gretta, revela as marcas de um passado, que se tornou cicatriz em seu corpo e em sua alma. Sinto suas lágrimas caírem sobre o lençol branco do tempo.

               Lá fora, a chuva pára, o sol surge timidamente, a manhã parece uma estampa melancólica. Invade os poros de minha consciência. Minhas próprias lembranças brotam como água de uma nascente e correm para além dos córregos. Como numa tela de tv led, os fragmentos de manhãs e noites vividas vêm se juntar nesta manhã de sábado. Num desses sábados de Hi-fi, vejo um solitário e tímido rapaz na Praça do Cruzeiro. De dentro da multidão, ele observa a mulher que ama encostada na entrada do Acri Clube. O olhar dela, a tez morena de sua pele, os seus cabelos pretos se projetam no espírito dele como num painel móvel de gravuras. Ele imagina convidando-a para dançar Save a prayer. Seu rosto de espinhas colado no rosto dela, a boca dele roçando a orelha dela. O gesto dos lábios de quem tem algo importante para dizer, tudo que um coração humano pudesse ouvir e sentir. O jovem solitário vê um cara chegar de motocicleta. O motoqueiro, de corpo largo e barba espessa, para ao lado dela. Ela se aproxima do motoqueiro. Ele a pega pela cintura e a abraça, cochicha em seu ouvido. Ela sorri e pula na garupa da motocicleta e vai embora de Itabi. O jovem solitário se dirige à budega de Sêo Nelson. Pede um copo cheio de domecq, vira o copo de vez, olha pro copo vazio e diz pra si mesmo: “ela vai embora, e eu fico aqui, preso a ela como um condenado sem culpa”. Paga a dose de domecq e sai em direção ao Acri Clube. O salão está cheio. Entra no salão e começa a dançar Boys don't cry, como se tivesse com o diabo no corpo.

                     Levanto-me do sofá e saio para fora. Olho mais uma vez para o céu. Meu olhar se detém no pé de alfazema ao lado. As abelhas e as borboletas, sem melancolia em um tempo sem-tempo, se banqueteiam em suas flores brancas. Vou até o portão. Me escoro nele e observo a rua por onde a vida passa sem ser vista. O vento sopra minhas memórias. Os mortos estão vivos dentro de mim. É impossível nos libertar deles. Estão gravados em nós como tatuagens. Respiro fundo, estendo as mãos como se quisesse segurar o vento e dominá-lo. Uma mulher passa pela rua, e uma outra, da sacada de uma casa, diz: “Olhe o vírus, mulher. Cadê a máscara!”.

                    Recolho os meus mortos e entro. Coloco uma dose de whisky e viro de uma vez. Horas depois, ligo o carro e saio em direção ao Centro da cidade. Os mortos adormecem em mim. Acelero e digo um grande “sim” a tudo que passou, abraço as sombras dos que se foram e dos que ainda estão aqui. O sol agora esquenta os ossos da cidade, o sopro quente do dia anima o meu espírito.


sábado, 10 de outubro de 2020

NADA É PARA SEMPRE (CONTO)

 

                                                                                               À memória de Meu Pai, Eurico.

              Passava pouco das oito da manhã. Meu pai selou Estrelante, um cavalo pé-duro, com quilômetros de cascos rodados, presente do meu avô para mim e meu irmão. Forrou a garupa com um coxim de algodão. Minha mãe se apoiou na crina do cavalo, passou o pé no estribo e montou na sela. Ela encostou o cavalo na calçada, pulei na garupa e me endireitei no coxim de algodão. Atravessamos a cancela e descemos a estrada naquela manhã de inverno.

           Era mês de maio, a estrada estava molhada, havia várias poças d’água ao longo dela. O Sol não ardia, parecia apenas um candeeiro por trás das nuvens. As rolinhas surgiam por sobre as campinas, um gavião-peneira surfava no céu, os tizius davam cambalhotas e cantavam nos cercados de arame. Os sertanejos preparavam suas roças para o plantio de milho e feijão. No inverno, o sertão se assemelhava a um paraíso úmido, verdejante, onde só a alegria, a inocência e a eternidade existiam.

        Depois de quarenta minutos, minha mãe entrou por uma porteira aberta. Notei que era a casa do Tio Artú. Vi algumas carroças atreladas a burros, cavalos apeados na sombra de dois juazeiros e nas estacas do aramado. Minha mãe parou Estrelante debaixo de um pé de jasmim branco, ao lado da casa de Tio Artú. Me segurou pelo braço e me ajudou a descer. Em seguida, ela desmontou e amarrou o cavalo. Passou as mãos pelos seus cabelos, assanhados pelo vento. Ajeitou os cabelos, me pegou pela mão e saímos em direção à casa. Era uma casa bem comprida, de taipa. Da frente até o monturo, havia girassóis enfileirados. As galinhas ciscavam sob os girassóis e ouvia-se gruídos de porcos no fundo da casa.

           Um grupo de pessoas proseavam no terreiro. Alguns homens estavam reunidos no telheiro. Minha mãe deu bom dia para eles e entrou, me puxando pela mão. Na sala, exalava um forte cheiro de jasmim. Minha mãe deu a benção e abraçou Tia Virgília, sentada numa cadeira, dentro de um vestido preto, sem alegria no rosto. Minha mãe foi se acomodar próxima à janela da sala. Fiquei ao lado dela, catando o enredo nos gestos e trejeitos. Dois homens estavam de pé, ao lado de um caixão de madeira, no centro da sala. Reunidas ao redor, dezenas de mulheres costuravam rezas. Os homens, com chapéus nas mãos, tinham expressões sérias e os olhos detidos no caixão. Dentro dele, Tio Artú, de camisa branca surrada da roça, com as mãos enlaçadas sobre o peito. Em seu rosto, nenhum sorriso, nenhuma expressão, parecia estar dormindo. Havia flores de jasmim branco arrumadas nas bordas do caixão e sobre Tio Artú.  As mulheres mais velhas, vestidas de preto, rezavam com os terços entre os dedos. Algumas choravam por trás de seus lenços. Os dois homens saíram em silêncio para o terreiro. Ao lado de minha mãe, ouvi um grito de oi, oi, seguido de um choro abafado. Vi uma mulher levando um lenço à boca, estendeu as mãos para o telhado e se calou. O coro de rezadeiras não deixava as ladainhas se perderem nas brechas da parede. Minha mãe não chorava, rezava batendo os lábios de leve, com o olhar pregado no chão de barro batido.

           As rezas e o cheiro do jasmim branco enchiam o ar da sala, enquanto o vento galopava lá fora. Depois de um tempo, deixei minha mãe, saí da sala na ponta dos pés, passei a porta e corri para perto de Estrelante. Fiquei ao lado dele. Segurei suas rédeas, passei minhas pequenas mãos pelo seu focinho, afaguei a estrela branca no meio da testa. Ele cheirou meus cabelos e senti seu bafo quente. No alto, os galhos do jasmim dançavam sobre nossas cabeças.

           Vi as pessoas se movimentando no terreiro, alguns homens entraram na sala. Minutos depois, seis deles saíram carregando o caixão fechado. Tio Artú lá dentro, em sua camisa branca surrada da roça, ornado com flores de jasmim. Atrás do caixão, se juntaram o restante dos homens e as mulheres. O caixão foi colocado em uma das carroças. Alguns subiram em carroças, outros montaram em seus cavalos. Seguiram a carroça que conduzia o caixão de madeira. Na saída da porteira, as mulheres retomaram as rezas e o cortejo desceu a estrada molhada naquela manhã de inverno. Minha mãe saiu para o terreiro. Corri até ela e disse:

           “Mãe, vamos pra casa, né!?”.

Ela me espiou por um instante, levantou a cabeça, caminhou até a porteira e parou, vendo o cortejo descendo a estrada. Deu meia volta e entrou na casa. Abraçou Tia Virgília, que não pôde seguir o cortejo. Se despediu dela, saiu da sala e fui atrás. Ela desamarrou Estrelante do pé de jasmim. Me pegou pelos sovacos e me jogou na garupa. Botou o pé no estribo e montou. Instigou Estrelante para fora da porteira, virou à esquerda e pegou o caminho de volta para casa. Quem prestasse atenção no rosto do garoto, sacudido pelo galope do cavalo, veria não só a satisfação da volta, mas uma expressão intrigada, um espanto do tamanho dele.


                                                         ***

         Três meses depois, quando o verão abria as suas portas, acordei com o berreiro das vacas e dos bezerros. Saí para fora. A luz do sol já se esparramava pelo terreiro e acariciava os espinhos do mandacaru, ao lado da nossa casa. Vi Zinho sobre a cancela do curral, assistindo meu pai tirar o leite das vacas, e Uísq deitado ao pé da cancela com o focinho sobre as patas.

           Entrei, calcei meu kichute e fui para o curral. Subi na cancela e fiquei ao lado de meu irmão. Meu pai soltou o bezerro, desapeou a vaca Lindaci, pegou o balde cheio de leite e veio depositar num vaso de latão, encostado no canto da cancela. Limpou o suor do rosto com a camisa, olhou pra nós e disse:

           “O cavalo de vocês está ali, deitado”.

           “Onde, pai”, perguntou Zinho.

           “Ali embaixo. No fundo do chafariz”.

           “O que ele tem, pai?”, perguntei.

           “Não sei. Deve ser dor de barriga!”

           “Vamo ver ele, Zinho!

           “Nico, vá pra lá não. Ele...”, meu pai se calou e saiu com a corda no ombro e o balde não mão, assobiando Triste Partida. Apeou Boa Sina, botou o bezerro para puxar o leite. Amarrou o bezerro no antebraço da vaca, pegou o banco e sentou nele, de frente para o ubro dela, de costas para nós. Colocou o balde entre suas pernas e começou a ordenhar.

          Desci da cancela em silêncio e saí para a estrada, Uísq colou do meu lado, abanando o rabo. Zinho cabrerou e ficou me olhando da cancela. Eu e Uísq descemos a estrada, correndo. Entramos no chafariz, ao lado da cerca do pasto de meu pai. Subi no chafariz, apurei a vista e apontei o dedo.

           “Ói ele ali, Uísq, detrás daquela moita de juazeiro”.

 Passamos debaixo do arame e seguimos pelo pangola. Acolá, as espanta-boiadas chiavam ruidosamente, o sol subia radiando sua luz por sobre o campo. Contornamos a moita do juazeiro, vimos Estrelante arriado sobre o pangola. Uísq farejou seu pelo castanho e ficou me observando.  Andei em torno do velho cavalo. Parei na frente dele. Sentei no capim, Uísq encostou do meu lado. Toquei nas ventas do cavalo, respirava com dificuldade. Afaguei sua grande testa, sua estrela branca no meio dela. Seu olho parecia contemplar o céu azul da manhã. Um olhar fixo, impassível e calmo. Me perguntei se ele sabia o que estava acontecendo, se via alguma coisa, por que não se erguia e saía galopando. Ele tentou levantar a cabeça, parecia sem forças. Observava ele sem poder fazer nada. Lembrei dos momentos bons que vivemos juntos, desde o dia em que meu avô tinha deixado conosco. A pesar de velho, não era manhoso nem preguiçoso. Era um cavalo útil para os pequenos afazeres e as pequenas viagens, além de fazer a alegria dos garotos.

          Toquei de novo em suas ventas, não senti o bafo quente, não senti mais bafo nenhum. De novo, examinei seu olho aberto, parecia fixar o infinito. Era como se ele estivesse mirando para dentro do universo, para uma terra desconhecida, com um sentimento de comunhão fatalista. Não havia rezas fúnebres, não havia medo, nem despedida no seu globo ocular. Tive a impressão de que aquele olhar me ensinava algo sutil, que não pude captar de vez. Mas captei o suficiente para intuir, através dele, que nada dura como duram as pedras da estrada.

           Me pus de pé e ergui a cabeça. Vi o telhado da minha casa, a fumaça saindo da chaminé. Ouvi a voz rouca de meu pai, entoando uma cantiga no curral. Olhei uma vez mais para Estrelante, ali deitado em sua paz. Dei meia volta e Uísq me acompanhou. Pegamos a vareda e saímos no chafariz.

           Subi a estrada devagar, com Uísq ao meu lado, sentindo uma tristeza agarrada nos cabelos, como se fosse arapuá. Fui chutando uma pedrinha aqui, chutando uma ali e outra acolá. Catei algumas no chão e sai lançando as pedrinhas por cima do arame farpado, entre os arranhentos. Para além de onde elas caíam, o sertão começava a perder o encanto da terra verdejante.